quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007
Crônica: "Será o Benedictus?"
Será o Benedictus?
Paulo Cezar Guimarães
Spinoza para mim é Valdir. Ou melhor, Valdir Spinoza, técnico de futebol. Ou, mais do que tudo, “São Valdir Spinoza”. Afinal, foi ele quem deu o tão sonhado e sofrido título de 1989 ao meu Botafogo, após 21 anos de jejum. Mas, para a chamada “Comunidade Acadêmica”, Spinoza é aquele filósofo holandês do século XVII. E vá você dizer que não! Quem conhece o meio acadêmico sabe como é a “Fogueira das Vaidades”. Futebol é coisa de alienado, ópio do povo, papo sem graça ... e coisas do gênero. Tem gente que sai de perto só de ouvir a palavra bola; se botar o pé na bola, então, passa longe.
Outro dia, numa livraria, encontrei dois amigos “intelectuais”, conversando. Falavam em Campanella, Patrizzi, Pietro Verri, Pico de Mirandola e Giordano Bruno. Pensei que estavam conversando sobre cantinas italianas e mandei, na bucha:
“ Eu gostava muito da Tarantella, aquela bem antiga, da Barra, que fechou. Tinha um pãozinho com lingüiça que era...”
Não deixaram eu completar a frase. Contraíram os lábios, fazendo aquela cara de desaprovação, que muito se parece com um maracujá de gaveta, e desconversaram. Desconversaram mesmo, pois é difícil chamar aquele dialeto que eles usam de conversa. É um tal de Bacon para cá, Nietsche para lá; Lacan, Kierkegaard...
Um outro dia, meio irritado com mais um fracasso do Botafogo, que já se tornou rotina, encontrei de novo com os dois e resolvi provocar:
“Gente, não dá para vocês colocarem uma legenda embaixo enquanto conversam? Ou, pelo menos, arrumar alguém para dublar?”
Para quê? Começaram a falar em Christian Huygens, Antonie van Leeuwenhoek, Jan Swammerdam, Joost van den Vondel e De Vermeer. Pensei até que estavam escalando o time da seleção holandesa. Tanto que tentei me enturmar:
- “E o Johan Cruyff? Era um cracaço, né? O filho dele também é jogador...”
E o pior é que a coisa pega. Com esse negócio de o MEC passar a exigir pós-graduação, doutorado, essas coisas, para uma profissão em que o próprio diploma é questionado, soube que um amigo jornalista e professor decidiu fazer mestrado. O cara era supernormal: torcia pelo Flamengo, conversava sobre mulheres, tomava chope e viajava todo ano para Miami e Orlando. “Tirante” o quesito mulheres e o chope, tem gente que gosta dessas coisas, né?
Semana passada, encontrei-o na rua e puxei conversa:
“E aí: o que você achou da briga do Wanderley Luxemburgo com o Marcelinho Carioca?”, tentei puxar conversa.
“Que Luxemburgo? É parente da Rosa de Luxemburgo?”, cortou ele.
“Pô, o cara fez a maior burrada quando era técnico do Brasil numa Olimpíada. Convocou um tal de Mozart que...”, insisti.
“Agora sim, sobre Mozart eu converso. Gosto muito daquela sinfonia dele que...”
E desandou a falar de Mozart, Beethoven, Bach, Wagner, Liszt...
Em tempo: Para vocês não dizerem que o colega aqui é desinformado, lá vai: esse tal de Spinoza nasceu numa família judia, a 24 de novembro de 1632, em Amsterdã, Holanda (o mesmo ano do nascimento de Locke-1632-1704). Faleceu em Haia, no ano de 1677. Seu nome hebreu era Baruch, que significa abençoado, e nas suas obras publicadas em latim, Benedictus. Viveu na chamada "Idade de Ouro" da história da Holanda, uma era de grandeza econômica, política, e cultural, apoiada na expansão comercial, quando a pequena nação do Atlântico Norte ombreou com as mais poderosas e influentes nações da Europa. A qualidade de vida tinha um padrão geral de bem-estar marcado pela simplicidade. Havia proximidade de nível entre as classes e respeito às pessoas (nada comuns nos demais países europeus). Spinoza, seguindo sua própria filosofia, viveu de maneira simplista. Na rica Holanda daquela época, isto não significava pobreza e muito menos indigência.
Naquela época, além do próprio Spinoza, o filósofo René Descartes viveu e escreveu suas obras na Holanda, por duas décadas.
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2 comentários:
E afinal: por onde anda Spinoza, o churrasqueiro que não ganha mais títulos por ninguém? Estou voltando a ocupar meu espaço aqui. Vou estar mudando de email pra esses dias, assim que souber, te aviso. []s
Parece que está trabalhando no Vasco com o Renato Gaúcho.
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