quarta-feira, 19 de setembro de 2007
Kerlon, foca, cruzeiro e Botafogo, claro
"Tá tudo muito bom, tá tudo muito bem!", como cantava a Blitz. Mas "esqueçam o que eu escrevi", como diria aquele ex-presidente. Adorei ver o Kerlon dar aquele drible da foca no Coelho, do Atlético. Mais adorável ainda foi ver o Leão reclamando na televisão. Mas vou logo avisando: se o Kerlon tentar fazer o mesmo contra o meu Botafogo, no Engenhão, vou torcer pro Diguinho jogar ele na linha do trem. E estamos conversados!
O artigo abaixo foi publicado no Jornal de Debates (www.jornaldedebates.com.br)
Como Garrincha a driblar o mar!
Paulo Cezar Guimarães
Nunca aprendi a dar “chaleira”, “banho de cuia”, “lambreta”, “lençol” ou “drible da vaca”. Devo no máximo ter passado a bola entre as pernas de algum “pereba”.
Vou logo avisando: adoro dribles. Era criança quando Garrincha brilhou no meu Botafogo no início dos anos 60. Não é à toa que sou botafoguense por causa de Mané, Didi, Nilton Santos, Jairzinho e cia. Peguei a fase decadente do “Demônio das pernas tortas” quando ele perambulou pelo Corinthians, pelo Olaria e até pelo Flamengo. Chorei de emoção no jogo de despedida no Maracanã, em 19 de dezembro de 1973, no chamado “Jogo da gratidão”. E que gratidão! Vi diversas vezes o filme de Joaquim Pedro de Andrade sobre Garrincha e meu camarada Oswaldo Montenegro escreveu uns versos sobre Mané na canção “Celeiro” em que diz “e viu a gaivota imitando Garrincha a driblar o mar”.
Quem sou eu para imitar o mestre Armando Nogueira, que faz prosa e verso quando escreve, mas acho que ele concordaria com Oswaldo. Garrincha driblava tudo o que via pela frente. Adversários, jogadores do mesmo time, terra, mar e ar. No final dos anos 60, quando comecei a acompanhar futebol, chegava mais cedo ao Maraca só pra ver Nei Conceição bater bola antes dos jogos, no aquecimento do time dentro de campo. O cara tinha o apelido de “Nei Chiclete” devido à intimidade que tinha com a "pelota". No mesmo time jogava Rogério (Haetmaneck), apelidado de “Dançarino”, pela mesma magia dos seus dribles.
Mais tarde vi Rivelino e seu elástico. O drible que ele deu no jogador Alcir, do Vasco, até hoje é repetido na televisão para desespero ou, quem sabe, orgulho do jogador vascaíno. E o Júlio César, o “Uri Geller”, do Flamengo? E o Mário Sérgio, hoje técnico de futebol, e, infelizmente, adepto do futebol-força? Vi Mário Sérgio, num Fla-Flu, dar um drible no jogador Toninho que quase destroncou a clavícula do cara, que por pouco não derrubou a bandeirinha de córner. Toninho saiu catando cavaco, como se dizia na pelada, totalmente desconjuntado.
Um amigo meu, Rubens Walter Marfetan, o "Ché", fotógrafo esportivo, disse que uma vez levou um drible de Paulo César Caju, craque do Botafogo e da Seleção Brasileira. E não estava jogando; estava fotografando, atrás de um dos gols do Maraca. “O cara fez que ia e acabou fondo, como diria o Dadá Maravilha. Tentei acompanhar com a minha máquina e acabei me desequilibrando e caindo entre os colegas. Foi uma gargalhada geral”, contou ele.
Uma vez, como editor de um jornal de empresa, precisava de uma foto que ilustrasse a vitória do Brasil na Copa de 70. Um colega sugeriu que eu usasse a foto de Carlos Alberto (Torres) erguendo a Jules Rimet. Disse que não, que aquela imagem todo mundo conhecia. Pesquisei e encontrei uma foto de Erno Schneider, em O Globo, mostrando um drible de Jairzinho, no jogador italiano Fachetti, no jogo final.
Já ouvi muito craque dizer que acha o drible muito mais bonito do que um gol. E é verdade. Mesmo porque muitos gols são precedidos de belos dribles. Quem não se lembra do elástico do Romário no Amaral do Corinthians? Dodô repetiu o drible no último domingo no mesmo estádio contra o mesmo Corinthians. Não fez o gol, mas a jogada foi destaque nos programas esportivos.
Sou peladeiro de fim-de-semana e não consegui copiar Mané, Rivelino e Paulo César. Me lembro de três craques do futebol de salão (hoje futsal) que brilhavam por causa dos seus dribles. Serginho, que jogou no Vila, e driblava sobre a linha lateral da quadra; e Marcio Arrochelas e Jairzinho (filho do Jair Rosa Pinto), que jogaram no Grajaú Tênis, e tratavam a bola de você.
Nunca aprendi a dar “chaleira”, “banho de cuia”, “lambreta”, “lençol” ou “drible da vaca”. Devo no máximo ter passado a bola entre as pernas de algum “pereba”. Mas domingo que vem vou ver se aprendo o drible da foca. Portanto: deixem o Kerlon driblar como um Mané Garrincha, como um Rivelino, como uma gaivota. Quero ver se aprendo.
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