Eu sei que hoje é quarta-feira e que o título da crônica são versos do imortal Vinicius de Moraes.
E os poetas são aqueles que enxergam primeiro, são mais artistas que um cronista semanal, por exemplo.
Agora, com a idade entrando na carne e na dor da gente, vamos percebendo o significado de uns versos que ficaram na nossa memória de adolescente. Entendemos melhor, digamos assim.
O sábado, por exemplo. Nunca dei tanto valor para o sábado, como agora. Em primeiro lugar porque tem o domingo depois. Esse sim, como diz o Jornal da Tarde, é o dia do bode. Ou seja, no sábado você tem direito a tudo e ainda conta com o domingo para sarar, recuperar, tirar as culpas. Não fosse domingo o dia da família, talvez até desse para enfrentar. Mas domingo é um horror. Já começa com missa logo de manhã. Pode? Mesmo quando a gente viaja. Domingo é o dia da volta, das filas. E o pior, do domingo, é que é a véspera de terrível segunda-feira.
Segunda-feira, como todo mundo sabe, é o dia de começar tudo. Desde o trabalho e o regime, aquele desejo de parar de fumar, beber menos. Não pode haver dia pior porque, na verdade, a única coisa que todo mundo faz mesmo na segunda-feira, é trabalhar. Planos e projetos ficam sempre para o mês que vem. Principalmente a dieta e o cigarro. E quer coisa pior da segunda-feira que o colega (ou a colega) de trabalho do lado contar como foi o fim de semana dele? Em detalhes?
Mas voltemos ao sábado. No sábado tudo é permitido. Tudo. Até brochar, num sábado você pode. Mas brochar, por exemplo, numa quarta-feira é imperdoável, literalmente. Sábado, não. Tem outras horas, mais tarde, quem sabe, mais um uisquinho. No sábado as nossas mulheres entendem.
No sábado tem o churrasco em casa e a feijoada no restaurante. Em ambos os casos não tem hora nem para começar e nem para acabar. Não é como a feijoada de quarta-feira onde o cara se enche todo e volta, coitado, para a repartição, arrotando e flatulando.
No sábado você pode desejar a mulher do próximo, mesmo que ele esteja próximo. Pode acordar a hora que quiser. Pode deitar a hora que quiser. Pode encher a cara e esvaziar a cabeça.
No sábado, de noite, você pode jogar um poquerzinho com a turma que a sua mulher não vai reclamar. Mas experimente marcar um pôquer para a quinta-feira. Dá briga. Tudo pode, no sábado.
Não é muito mais gostoso ir ao futebol no sábado? Domingo é dia de ficar em casa vendo pela televisão, as reprises, aqueles gols todos.
Sábado é dia de cinema e teatro. Tem sábado que dá até para enfrentar uma pizza. Mas pizza noutro dia é cafona. Pizza na quinta, por exemplo. Não tem sentido. No sábado, não. É programa.
A sexta-feira pode ser considerado um péssimo dia. Último dia de trabalho, você cansado. Mas a sexta-feira tem uma vantagem. No outro dia é sábado. Na verdade, o verdadeiro sábado começa quando você sai do seu trabalho. Quando escurece na sexta-feira, já estamos no sábado. O sábado vai das seis da tarde da sexta, até a madrugada de domingo. Sim, o sábado é o único dia da semana que tem 36 horas. Corridas e lentas ao mesmo tempo.
Quer dia melhor para lavar o carro, visitar os filhos? Quer trânsito melhor que o de sãbado? O carro desliza pela cidade como se estivéssemos em outro planeta.
Sábado é o único dia da semana que dá para ver um filme na televisão, de tarde, sem ficar com culpa. Numa boa.
Sábado tem sol mais bonito, o dente de siso não dói, a úlcera some (volta sempre na segunda de tarde), o uísque desce mais macio, a gente demora para ficar de porre. A gente tem o dia inteiro para ler o jornal, fazer palavras cruzadas.
Eu acho que quando Deus criou esse nosso mundo, deve ter pensado: vou fazer um dia só para os homens. O sábado. As mulheres que me desculpem, mas sábado é um dia masculino, com o que (eu acho) o meu grande poetinha ia ter que concordar.
Tudo isso só porque hoje é sábado e eu estou escrevendo essa crônica para você.
Fonte: O Estado de S. Paulo
sábado, 2 de junho de 2007
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