Fernando Sabino continua sendo um dos meus ídolos. Suas crônicas são pra sempre. Em “O que faz um escritor”, do livro “O gato sou eu”, ele conta a história de uma entrevista que concedeu a uma estagiária de um jornal do Rio. IMPERDÍVEL.
- Me mandaram fazer com você uma entrevista sobre o marquês – e ela foi ligando logo o gravador.
– Que marquês? – estranhei.
- Esse que vocês editaram.
- Não editamos nenhum marquês que eu saiba.
- O autor desse bestseller de vocês, Cem anos de perdão.
- De solidão.
- Ou isso: de solidão. Ele não é marquês?
- Não. Ele não é marquês. O nome dele é Gabriel García MÁRQUEZ. Com z no fim. Se duvidar, é capaz de ter até acento no A.
- Então é isso. Foi confusão minha – e ela não se deu por achada, muito menos por perdida, sempre empunhando um microfone junto ao meu nariz:
- Por que é que o livro dele está fazendo tanto sucesso?
- Porque é um livro muito bom.
- Foi por isso que vocês publicaram?
Respirei fundo:
- Por isso o que, minha filha?
Ela me olhou como se estivesse entrevistando uma toupeira:
- O que estou querendo saber é por que vocês publicaram o livro dele.
- Porque nos foi recomendado como sendo um livro muito bom.
- Recomendado por quem?
- Pelo Neruda.
- Quem?
- Pablo Neruda. Quando ele esteve no Rio pela última vez, falou com o Rubem (Braga) que se tratava do romance mais importante em língua espanhola desde Dom Quixote.
- Quem é esse?
- Esse quem? O Rubem?
- Não, o outro.
- Dom Quixote?
- Não. Esse cara que você falou antes. O que recomendou o livro.
Resolvi deixar cair:
- Você vai me desculpar, minha filha, mas não dá. A entrevista fica para outra vez, quem sabe. É muita honra para um pobre marquês, mas infelizmente... Ou Márquez se você não se incomoda. No mais, muito obrigado.
- Eu é que agradeço!
Ela desligou o gravador, com ar satisfeito, despediu-se e foi-se embora.
segunda-feira, 11 de dezembro de 2006
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário