quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Entrevista com David Barsamian, por Rafael Roldão

O jornalista independente David Barsamian já lançou diversos livros no Brasil com entrevistas com personalidades como Noam Chomsky, Tariq Ali, Edward Said e muitos mais. Meu aluno Rafael Roldão entrevistou ele pro Jornal Laboratório da FACHA.

A seguir a entrevista no original. Quem quiser ver a página, é só clicar www.facha.edu.br - Publicações - Jornal Laboratório

pc

Jornal Laboratório
FACHA
Entrevista: David Barsamian
Autor: Rafael Roldão


“Um Agente contra o Imperialismo”


“Nós precisamos de inspetores das Nações Unidas nos Estados Unidos para proteger a gente de todo o lixo que a mídia produz”. As palavras são do americano David Barsamian e dão uma pequena amostra de como ele pensa e do que ele disse em entrevista exclusiva ao Jornal Laboratório. Jornalista independente, Barsamian viaja pelo mundo dando palestras sobre a política externa dos EUA. Ele é criador e diretor da Alternative Radio (www. alternativeradio.org), uma rádio pela internet que abre espaço para grandes pensadores e recebe milhares de visitas diárias. No Brasil, o americano ganhou fama depois que foram publicadas em português suas entrevistas com Tariq Ali, Noam Chomsky e Edward Said, além de “Palavras Explosivas”, livro que reúne encontros do jornalista com 21 intelectuais mundiais.

O que significa ser um jornalista independente nos Estados Unidos? Por que escolheu esse caminho do jornalismo em vez do tradicional?

Ser um jornalista independente significa estar livre da coerção e da censura sem estar ligado ou ser subserviente ao poder. Eu não tive escolha. Por que eu seria um lacaio para um agente do imperialismo e do capitalismo predatório?

E de que forma você se mantém como jornalista independente?

Eu criei um novo modelo. Eu produzo e distribuo um programa semanal de rádio com duração de uma hora, livre dos encargos que as rádios públicas e comunitárias costumam pagar. Eu suporto meu projeto através dos ouvintes que compram os CDs e textos dos programas que eles ouvem no rádio.

Você me falou sobre “ser um lacaio para um agente do imperialismo”. A imprensa americana inteira é um instrumento do imperialismo?

Pode ser ou não. Basicamente sim. A mídia dos EUA serve como instrumento para a propaganda política estatal. Eles se recusam a discutir o imperialismo, exceto quando isso está relacionado com outros países. A mídia reporta as coisas somente de A à B, ao invés de A à Z. Ela contribui para a falta de informação que a maioria dos cidadãos americanos tem sobre seu próprio país.

Quando você veio ao Brasil para o FSM (Fórum Social Mundial) você estava vestindo uma camisa com a frase “O campo de batalha está entre seus ouvidos”. O que quis dizer com essas palavras?

Que memória! Sim, o poder quer controlar o que as pessoas estão pensando. É importante para eles direcionar a atenção das massas para longe de assuntos como guerra e paz, militarismo, imperialismo etc. O objetivo do poder é reduzir os americanos a meros consumidores, fazendo com que eles se preocupem se compram roupas na Banana Republic ou na Gap e mantendo o foco deles nos esportes e nas celebridades de Hollywood. A mídia funciona como uma arma de distração de massas. Nós precisamos de inspetores das Nações Unidas nos Estados Unidos para proteger a gente de todo o lixo que a mídia produz. A camisa foi para encorajar as pessoas a resistir, reconhecer o que é propaganda política, destruir isso e criar alternativas.

No livro em que você entrevista Noam Chomsky ele diz que os pretextos de Bush para invadir o Iraque “não são mais convincentes que os de Hitler”. Você concorda com isso? O que acha da política externa de George W. Bush?

Não chega a ser nem uma afirmação discutível. Historicamente, todos os senhores da guerra sempre declararam que queriam proclamar a paz e espalhar liberdade e democracia. Isso não passa de propaganda política primária destinada aos cidadãos norte-americanos. É importante que esses cidadãos sofram uma espécie de lavagem cerebral. Bush é culpado pelo “supremo crime internacional – o planejamento e financiamento de uma guerra agressiva” (Carta das Nações Unidas). Ele e o bando de criminosos em volta dele deveriam ser desmascarados pelo Tribunal Internacional de Justiça em Haia.

Como a idéia de criar a Alternative Radio surgiu? Você sempre trabalhou com rádio ou foi sua primeira experiência?

A AR nasceu por acaso. Eu morava na cidade de Nova York onde lecionava inglês em uma escola de línguas no World Trade Center quando, em 1978, me mudei para Boulder, Colorado. Na minha chegada me falaram que uma rádio comunitária, que acabara de começar suas transmissões, estava precisando de voluntários para fazer programas. Eu propus fazer “Gangs of the Nile”, um programa de música internacional. Em pouco tempo eu já tinha meu próprio programa, uma vez por semana, que rapidamente ficou muito politizado. Eu não podia simplesmente tocar uma música sem dar aos ouvintes o contexto e a história em que ela estivesse inserida. Na KGNU eu aprendi tudo o que precisava saber sobre redação, produção, edição e locução em rádio. Depois, eu comecei o projeto da minha Alternative Radio em 1986, há 20 anos.

Quantas pessoas costumam acessar a AR por dia? Você pensa em traduzir os programas e textos para outras línguas?

Centenas de milhares de pessoas em todo o mundo costumam acessar nosso site e ouvir nossa programação. Traduzir é um trabalho que exige muita dedicação e dinheiro. Por enquanto não devo fazer isso.

O que você sabe sobre a política brasileira e o presidente Lula?

Eu sei que o Lula desapontou alguns de seus mais ardentes seguidores. É difícil navegar nas correntes traiçoeiras do FMI, do Banco Mundial e da OMC. Somados aos seus infortúnios ainda houve os escândalos de corrupção do PT. Eu espero que o Lula, se reeleito, se aproxime mais da Bolívia e da Venezuela, apóie mais a Telesur, fortaleça o Mercosul e distancie o Brasil do imperialismo norte-americano. Um outro mundo é possível e esse mundo vem do hemisfério sul. O Brasil pode e deve ser grande parte disso.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bela entrevista. Sim, um outro mundo é possível e, quem sabe, nele o Botafogo deixe de ser roubado?

PC Guimarães disse...

Caraca! Você foi buscar um post bem antigo. Obrigado pela visita e comentário. E quem sabe esse mundo sem Botafogo roubado seja um dia possível.
grande abraço, volte sempre.