domingo, 10 de dezembro de 2006

Crônica - antiga (Filho de peixe, peixinho é?)

Filho de peixe, peixinho é?
Paulo Cezar Guimarães

(O Felipe, destacado na crônica, trabalha hoje na Globo. Vi o crédito outro dia. Parece que nos Fantástico).

Segundo semestre de 2000. Começo a fazer a chamada na sala de aula, de trás para a frente, como sempre faço, para desespero das Anas, Beatrizes e Dorivais. Ao chegar na letra F, me surpreendo: Felipe Wainer.

- Wainer? Por acaso você é parente do Samuca?

- Filho – ele responde.

Neto do Samuel Wainer, claro. Fico emocionado, lembro do saudoso Samuquinha, que conheci e admirei. Felipe é uma pessoa simples, humilde, sabe o “peso” que carrega no nome, mas cursou a matéria numa boa, sem apelar para o “sabe com quem está falando?”. Um dia, não resisti e brinquei com ele, no melhor estilo “casseta e planeta”:

- Seu avô deu pra jornalista, seu pai deu pra jornalista. Você vai dar também, né?

Mas esse negócio de filho de gente famosa é curioso. A FACHA é uma faculdade da zona sul do Rio, e é comum ter gente famosa ou filha de gente famosa nas salas de aula.

Nelson Rodrigues Filho foi meu aluno. Compridão, barba quase no umbigo, desajeitado, uma figuraça. Lembro-me de uma aula em que eu falava sobre os estereótipos físicos criticados em algumas redações. Esqueci da figura dele.

- Olha gente: o jornalista deve tomar cuidado com a aparência para trabalhar em determinados veículos. Não pode ser desleixado e deve tomar muito cuidado com as roupas que usa.

E desandei a dar exemplos do que é certo e do que é errado no melhor estilo dessas publicações femininas que andam por aí.

- Barba comprida, por exemplo... – e Nelson coçou a enorme barba.

A turma esboçou um riso.

- Sandálias tipo havaianas ou de couro... - e Nelson levantou a perna mostrando a sandália surrada.

Cinco ou seis alunos deram risadas tímidas.
Distraído, ainda emendei:

- Calça jeans desbotada e camiseta de malha com inscrições, então, nem pensar - Nelson levantou-se, virou-se para a turma e subiu na carteira.

Foi uma gargalhada geral. Ainda tentei corrigir:

- Mas ele pode, ele pode; é filho e herdeiro de nome famoso.

Francisco, filho de João Bosco, também foi meu aluno. Só fui saber depois que o semestre acabou. E olha que dei uma arrochada nele durante as aulas... Não gostei da prova que ele fez, e critiquei, dizendo que estava mais para literatura do que para matéria de jornal. Também pudera, o garoto é poeta – e dos bons. Mas mesmo assim, aceitou o desafio e fez a tal matéria com cara de reportagem que eu queria.

No semestre passado, uma aluna veio me pedir para antecipar a prova, pois precisava viajar com o pai para o exterior;

- Para onde? – perguntei.

- Cuba – respondeu ela.

- E o que você vai fazer lá?

- Acompanhar meu pai.

- O que ele faz?

- É músico?

- Péra lá. Joana Hime? Então você é filha do Francis Hime?

Como sou fã do Francis, apesar de ele ter feito uma música gozando o meu Botafogo (“... e se o Botafogo for campeão...”) negociei.

- Só concordo em antecipar a prova se você trouxer um autógrafo do papai.

Passei alguns semestres um pouco tenso, cada vez que recebia a pauta. Vocês não têm idéia de quem foi aluna da FACHA!. Narcisa Tamboridegui, aquela socialite "escandalosa", que vivia envolvida em encrencas e até escreveu um livro. Cruzei – no bom sentido – uma vez com ela no pátio. Ficava imaginando ela entrando na minha sala de aula e dizendo:

- Que loucura!

Nota do editor: a Joana não trouxe o autógrafo e continua me devendo um autógrafo do Chico Buarque. Joana, can you read me?

2 comentários:

Lorenna Eunapio disse...

Oi PC!
Legal o blog!! Tinha um também, mas deletei por falta de tempo de atualizar.
Só li este post por enquanto, porque estou na correria (como sempre), mas vou tentar entrar pelo menos uma vez por dia, ok?
Minha colação é no sábado que vem, hein!!
Beijão!!!

PC Guimarães disse...

Valeu pela visita, Lorenna. Volte sempre. Bote nos seus favoritos.
E parabéns. Você foi das boas alunas que eu tive.
Sucesso.