Um galo debaixo da cama
Paulo Cezar Guimarães
Tenho um amigo professor que já rodou bastante por esse mundo afora, mas tem o chamado "desvio profissional" de não saber falar inglês. Aliás, nem inglês, nem francês, nem espanhol, nem... deixa pra lá.
Mas consegue, digamos, “arranhar” algumas coisas no idioma de Shakeaspeare e Ronald Biggs.
Uma vez, em Copenhagen, resolveu comprar, no balcão de turismo da Estação Central, uma passagem de barco de Copenhagen para Oslo, uma de trem de Oslo para Bergen (ida e volta) e de Oslo para Estocolmo, e uma de avião de Estocolmo para Copenhagen.
Saiu do balcão feliz da vida com todos os “vouchers”, certo de que, finalmente, tinha se comunicado naquela espécie de dialeto que ele achava ser inglês.
“Quando eu voltar pro Brasil, o pessoal vai ver só”, pensou.
Mas é claro que alguma coisa podia não dar certo. E não deu. Em algum momento, aquela mistura de “yeses”, “nos”, “thank yous” e gestos falhou.
Ao entrar no avião da TAP, na volta de Estocolmo para Copenhagen, a comissária de bordo indicou-lhe uma poltrona da Primeira Classe como sendo o seu lugar. Como a tripulação era formada por patrícios, foi fácil ele se comunicar e dizer à moça que não era possível estar na Primeira Classe.
– Você já viu professor viajar na Primeira Classe, moça? Deve estar havendo algum engano. Meu lugar é na classe Econômica, exclamou.
A moça conferiu o bilhete, e confirmou. Ele tinha um bilhete de Primeira Classe sim. Pior (ou melhor?): era o único passageiro a fazer aquele trajeto na Primeira Classe. O jeito foi relaxar e, digamos, gozar. Durante os 40 ou 50 minutos de vôo entre uma cidade e outra, teve uma comissária de bordo totalmente à sua disposição.
Na volta ao Brasil, contou-me:
– Rapaz! Fui tratado como um marajá. Só faltou a moça me botar no colo e fazer um cafuné. Até pastelzinho de Belém ela me serviu.
Só foi se tocar quando recebeu a fatura para pagamento do cartão de crédito.
Mas aperto mesmo ele passou em uma das 10 vezes em que esteve em Paris usando as três únicas expressões que aprendeu até hoje: “merci”, “pardon” e “bon jour”. De passagem por Geneve, comprou chocolates, um canivete e, claro, um relógio de pulso. Mas não era um relógio qualquer. Era um despertador que emitia o som de um galo.
“Adoro uma novidade” – é o lema da vida dele.
O mecanismo era mais ou menos o seguinte: quando chegava a hora de despertar, o danado do relógio acionava um “cocorocó” insistente e só parava quando se apertava uma tecla. Uma gravação dava bom dia e dizia a hora. Para facilitar um pouco as coisas, ele decidiu comprar um relógio com a gravação em espanhol – tinha também em inglês, em francês e em alemão.
Pegou o TGV em Geneve e desceu em Paris orgulhoso com o novo brinquedo no pulso. Cansado, foi para o hotel, e dormiu.
De madrugada, foi acordado pelo “galo” que não parava de cantar. Ficou apavorado. Tinha esquecido da novidade. Olhou debaixo da cama, revirou o armário e nada do galo. Já estava quase pronto para ir à portaria chamar o vigia, quando lembrou do relógio. Foi um sufoco até conseguir fazer o “galo” parar de cantar. Também tinha esquecido qual botãozinho tinha que apertar.
Quando, finalmente, conseguiu sossegar o “bicho” ouviu a mensagem:
“Son ocho horas e vente e tries minutos”.
sábado, 9 de dezembro de 2006
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3 comentários:
Muito boa! rsrsrs
Adoro essas crônicas!
Beijos
Brigadinho. Qual Fernanda? Posso publicar mais?
Japonesinha...
Fique a vontade...sinta-se em casa...rs
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