Meus alunos começaram hoje a desenvolver um blog sobre a Revista Diners, uma antiga publicação editada por Paulo Francis nos anos 60, e que fez sucesso no Jornalismo Cultural. Quando o blog entrar no ar, divulgo o endereço. Nesse início de pesquisa básica no "pai dos Burros", o Google, os alunos descobriram fragmentos de um texto sobre futebol escrito pelo genial Paulo Mendes Campos, escritor mineiro e botafoguense. Para quem gosta de bom texto e futebol, vale dar uma espiadinha na matéria que saiu há alguns anos no jornal "O Estado de Minas".
Quem puder ajudar os alunos com alguma dica sobre a revista será bem-vindo.
Vejam o fragmento:
"Futebol e Tecnologia"
"São fragmentos do artigo "Futebol e Tecnologia", do grande escritor mineiro Paulo Mendes Campos, publicado na revista Diners há 23 anos. Um texto mais do que atual, e que fazia parte da vasta biblioteca de outro escritor mineiro de muito talento, Danilo Gomes, que nos envia de Brasília esta raridade criada por Campos. Como se vê, o futebol brasileiro segue exatamente como há duas décadas, sofrendo a cada competição internacional as conseqüências da má organização. Se o nosso futebol ainda é bom nas quatro linhas, o mesmo não se pode dizer do gramado para fora.
FUTEBOL E TECNOLOGIA Daniel Gomes & Paulo Mendes Campos
O "Esporte como ele é " & "Futebol e Tecnologia", Daniel Gomes "O futebol brasileiro, abstraindo os países nos quais esse esporte é incipiente, é hoje um dos mais atrasados do mundo. Perdemos a Copa (...) por causa desse atraso galopante. Ao contrário do slogan político, regredimos cinqüenta anos em cinco. Que houve? Que se passou? Como foi que bateram a nossa carteira de campeões sem que percebêssemos?"
"Nossa hematita compacta continua sendo o melhor minério de ferro do mundo; mas a nossa siderurgia continua pra trás. A matéria-prima do futebol, igualmente, ainda é de excelente qualidade, mas infra-estrutura e a superestrutura vão piorando à medida em que os outros países aperfeiçoam um jogo que nós patetamente insistimos em considerar essencialmente improvisado. Pois a verdade elementar é esta: não pioramos propriamente, os outros é que melhoraram muito; ficamos para trás porque não soubemos acompanhar o ritmo do progresso dos outros. Ora, enquanto as virtudes instintivas dos nossos jogadoras derem para ir suprindo as nossas falhas de administração, iremos manerando; quando a organização dos outros chegar ao optimum da tecnologia, então entraremos definitivamente pelo cano."
"Por motivo de uma reação primária de subdesenvolvidos, temos horror à tecnologia. A quase nada aplicamos uma técnica, damos um jeito. Temos orgulho dessas espertezas de pobre; gostamos de zombar do cartesianismo francês, do método germânico, das filigranas mecânicas do japonês; achamos o americano, com sua mania de especialização, uma besta quadrada". "Isso, em todos os planos das atividades velhas e modernas, da eletrônica à plantação de batatas. Mas reservamos a lava mais rubra de nossa ira para os traidores da pátria que ousam reclamar tecnologia para o nosso futebol. Futebol se joga é no campo. A gente vai lá e engole eles. Não temos nada que aprender do estrangeiro..."
"A partir dessas premissas improváveis estamos cavando o buraco. E quando o nosso selecionado não consegue vencer um time mundial arrumado na véspera (um time no qual o goleiro nem pode dizer 'deixa' para o zagueiro, pois um embarcou em Moscou e o outro na Alemanha (...) aí disfarçamos e dizemos de boca mole: futebol tem dessas coisas."
"Eu me lembro dos jogadores de vinte anos atrás; cadeiras duras, sem malícia, matando a bola, quando matavam, debaixo da planta dos pés, fortes e resistentes, mas bobocas. Os húngaros e os italianos eram um pouquinho melhores, os outros eram todos pernas-de-pau. Hoje, quando assisto a um jogo de time estrangeiro, reconheço que eles aprenderam tudo o que sabíamos e criaram melhorias que ainda não ousamos sonhar possuir: um perfeito esquema de cobertura, por exemplo." "Teria o jogador europeu se desencantado, aprendendo futebol da noite para o dia? Não, o jogador europeu aprendeu a jogar futebol devagar, olhou, comparou, supriu suas próprias deficiências com o aprimoramento de suas qualidades naturais".
(...) "Enquanto os nossos zagueiros, postados em dura fileira como um pelotão prussiano, ficamo no 'salve-se quem puder', os zagueiros deles caem no espaço abandonado pelo companheiro num ritmo de Bolshói. Enquanto a nossa linha média troca tímidos totós no meio do campo, o apoiador e o volante deles esticam a bola para a frente. (...) Os avantes deles vão repetindo sempre as únicas jogadas das quais pode surgir um gol lógico". (...) Enfim, enquanto eles acreditam na tecnologia, nós acreditamos até o fim do mundo no futebol-arte, na improvisação, no talento, conceitos de grande força enquanto não entram em campo".
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