sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Adeus mundo cruel! - Minha Carta-Testamento



Há alguns anos, decepcionado com mais uma fase trágica do meu Botafogo, fiz uma humilde paródia da Carta-Testamento de Getúlio Vargas. Nela trocava todos os problemas de Vargas pelos problemas vividos pelo Glorioso. Decidi buscar no baú. Tudo a ver com o momento. É só trocar os nomes de algumas situações e personagens. E duro é que o Flamengo ainda brilhou no Maracanã. Cadê a garra do time botafoguense? Se o timeco do Flamengo consegue, por que o Botafogo não pode conseguir?

Eis a minha Carta-Testamento.

"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o Botafogo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre o meu time. Os torcedores de Vasco e Flamengo não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o meu Botafogo e principalmente seus humildes torcedores das besteiras do Rolim.

Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação de juízes como o Marçal Filho e times como o Flamengo e mais recentemente o Vasco, fiz-me parte de uma revolução e venci o Campeonato Carioca de 89 e 90, a Commebol, o Campeonato Brasileiro de 1995, o Torneio Rio-São Paulo de 97 e outros torneios pelo mundo afora, inclusive um na Espanha. Iniciei o trabalho de libertação e ajudei a instaurar o regime de liberdade social tentando fazer a cabeça de dois sobrinhos para torcerem pro time da estrela solitária. Tive de renunciar. Um escolheu o Vasco, o outro o Flamengo Voltei ao Maracanã nos braços do povo.

A campanha subterrânea do Eurico Miranda, querendo criar a disputa apenas entre dois times no Rio, aliou-se à dos grupos nacionais (Corinthians, Palmeiras, Atlético Mineiro e outros) revoltados contra o período de vitórias dos anos 90. O faturamento de lucros extraordinários conseguido em excursões pelo exterior nos anos 60 foi suspenso no período de Galdinos, Purucas, Tucas e Artures Pai Dégua. Contra a justiça da revisão do salário de nossos craques se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Seven Up e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Hyundai foi obstaculada até o desespero.

Não querem que o Botafogo seja livre. Não querem que o Botafogo seja independente. Assumi a posição de torcedor do Botafogo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho e de um regime de força; era apenas um adolescente. Acabaram com o nosso estádio e nos colocaram nos braços de um marechal. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Mas meu time sucumbiu ao Borer, Rivinha e outros. Veio a crise do Gilson Nunes e depois do Mauro Fernandes, e não valorizou-se o nosso principal produto: os juniores. Tentamos defender o trabalho do Mauro e seus ternos bem cortados e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa equipe, a ponto de sermos obrigados a ceder, escalando o Ruço, Marcelinho Paulista e o Galego. E agora trazemos de volta um velho capitão.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o meu Botafogo, que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue e minha camisa número 7 dos tempos do Túlio. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o botafoguense, eu ofereço em holocausto a minha vida.

Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão.

E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo da gozação dos torcedores de Vasco e Flamengo, inclusive do meu prédio, e hoje me liberto para a vida eterna. Mas essa torcida alvinegra de quem fui escravo não mais será escrava de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Botafogo. Lutei contra a espoliação da nossa torcida. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio.

Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História - ou melhor, saio da primeira divisão para entrar na segunda".

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